sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Perseguição e Resistência: eu vi e vivi!

* Homenagem ao Tenente Coronel AVELINO IOST
Discurso realizado em 27/08/2009

Seis de agosto de 1959! Companheiro Avelino! Iniciaste a viver o amargo sabor da perseguição política, ao seres reprovado em exame oral, no final do curso de oficial, e foste desligado do corpo de alunos na aeronáutica. Não te dobraste ao comando: Perseguido, expurgado, anistiado, reparado, com certeza não a contento, passaram-se cinqüenta anos.

Quando em ato de coragem acompanhaste a resistência de 214 suboficiais e sargentos que impediram o bombardeamento do Palácio Piratini, a mando dos conspiradores que pretendiam abortar a legalidade liderada pelo governador Leonel Brizola; quando te posicionaste bravamente pela liberdade aos resistentes, enfrentando com hombridade os argumentos pela punição, eu era um bebê com exatos três meses e três dias de vida.

Entre meus dez a quinze anos de vida, acompanhando a lida na agricultura, meu prazer era em dias de chuva ouvir de meu pai histórias que lhe vinham a mente. Ficou em minha memória o episódio dos heróicos trabalhadores da aeronáutica que não deixaram metralhar a casa do governador Brizola. Mal podia saber que enquanto meu pai contava estes fatos, exaltando os feitos dos heróis trabalhadores da aeronáutica, estes haviam sido presos e transferidos para a reserva. Muito mais, expurgados da carreira militar, a ti particularmente te proibiram de exercer a profissão civil de aviador e instrutor de vôo ou outra qualquer profissão formal. Tiveste que amealhar a sorte de um ambulante vendendo calçados de porta em porta para tirar o teu sustento e o de tua família. A mão invisível da perseguição continuou te atormentando e por várias ocasiões, te prenderam, te seqüestraram, te humilharam e chegaste a sentir a dor de um pai em ver teus dois filhos serem impedidos de seguirem a carreira militar. Mas, tua coragem, companheiro Avelino, permita-me assim chama-lo, foi mais forte que esta aniquilação profissional, familiar e pessoal.

Passaram-se os anos, passei a compreender melhor estes episódios da legalidade e do regime de exceção. Na anistia possível de 19709, participei do retorno dos heróis exilados. Cito dois gaúchos que tive a honra de recebê-los em manifestações estudantis pelo fim da ditadura militar: Leonel Brizola e Flávio Koutzi. No início dos anos oitenta, atuando como agente de pastoral de Comunidades Eclesiais, conheci Frei Betto e convivi com o Irmão Antonio Cechin. Compreendi melhor as agruras e as conseqüências de prisioneiros e perseguidos políticos.
Ubiratan de Souza e Avelino Iost! Vim a conhecê-los há apenas quatro anos, mas suas histórias já me eram familiares. Dois de tantos que já septuagenários e octogenários militam pela justa reparação e reconhecimento de suas cidadanias. Mais do que conhecer suas biografias, senti-me desafiado quando um dia Avelino me traz um envelope com um maço de folhas datilografadas e me diz: “Aqui está registrada minha sina. Já entreguei para muitos e ninguém deu bola”!

Fui pra casa, comecei a ler e assumi um compromisso comigo que iria encontrar uma forma de torná-los públicos, pois tua sina e tua coragem, emblema de um fato e momento histórico, deveriam passar às gerações futuras. Foi assim que só agora, com a colaboração de vocês e de amigos, conseguimos publicar este livreto que vamos doar para as bibliotecas das escolas de Canoas e aos professores de história. Agradeço também a AOSOL, através de seu Presidente Professor Adolfo Simon, pela publicação do mesmo. E digo mais: estamos tratando de incluí-lo nos Anais da Comissão da Anistia, a qual tem a possibilidade de realizar uma Audiência Pública ainda neste ano aqui em Canoas.

Obrigado pela oportunidade de prefaciar este fragmento biográfico. Recordei as reflexões de Michel Foucault pra retratar como é possível manipular um simples exame com fins punitivos. Lembrei o alerta atual de Norberto Bobbio de que as regras em disputa do jogo democrático tem dificuldade de permear a empresa e a administração pública. Com certeza, muito menos a instituição militar pública.

Por fim, encorajo-o a concluir suas memórias para que possamos passar à história toda desta tua trajetória que é um emblema, muitos mais da perseguição de um homem, tua teimosa resistência e militância pela verdade e pela justiça. Militante, pois saibam todos que tive também nestes anos, o privilégio de acompanhar as respostas que através de e-mails, Avelino dá aos teus pares de sina que ainda alimentam suspiros de conspiração contra a democracia.

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